Homeopatia no Brasil



Antes mesmo da homeopatia chegar ao Brasil, seu nome já havia sido mencionado nas cortes brasileiras, pois, Hahnemann havia trocado correspondência com José Bonifácio, sobre mineralogia,  já que ambos tinham grande interesse pelo assunto. Foi do Brasil que Hahnemann mandou buscar a planta Ipecacuanha para prepará-la em suas pesquisas.

Dr. Benoit Jules Mure, Bento Mure, como era conhecido aqui no Brasil, vindo de França, a convite de D. Pedro II, desembarcou no Rio de Janeiro, aos 21 de novembro de 1840, (data comemorativa do aniversário da Homeopatia no Brasil). Juntamente com seu amigo e discípulo, João Vicente Martins, cria a 1ª farmácia homeopática do Brasil e funda uma escola de Homeopatia, atualmente existe com o nome de Instituto Hahnemanniano do Brasil .
Seu discípulo, João Vicente Martins, traduz para o português a Quinta edição do Organon.
A homeopatia se espalhou pelo país rapidamente, sendo usada como kit de primeiros socorros pelas famílias, como no caso da minha onde meu bisavô materno, Sr. Calixto Fagonde que, com muita vontade de servir ao próximo, ia a cavalo com seus livros e sua botica homeopática atender a toda comunidade que vivia perto.  Com tantos casos de sucesso, a homeopatia também foi abraçada por grandes figuras da nossa cultura, como os escritores Monteiro Lobato  e Rui Barbosa.

Para sentir um pouco de como era o clima dos atendimentos pelo interior do país, aqui deixo você com uma das adoráveis correspondências de Lobato ao seu amigo Rangel:

Fazenda 3/3/1917

Rangel: A homeopatia!… Eu pensava como você; ou pior ainda, não me dava ao trabalho de pensar coisa nenhuma a respeito. Não acreditava nem descria – não pensava no assunto e pronto. Mas um dia sobreveio o “estalo” e fiquei tonto. O meu Edgarzinho apareceu com uma doença no nariz. Isso na fazenda. Ele tinha dois anos. Corro a Taubaté. Consulto os médicos locais: “O melhor é ver um especialista em São Paulo”. Vamos para São Paulo. “Quem é o baita para narizes?” J.J. da Nova. Vou ao Nova. Examina , cheira ,fuça e vem com um grego: “Rinite atrófica. Só pode sarar lá pelos 18, 20 anos – mas vá fazendo umas insuflações com isto e deu-me uma droga e um insuflador.

Voltamos para Taubaté, muito desapontados. Dezoito anos! Mas minha casa lá era defronte à duma prima. Vou vê-la. Tenho de esperar na sala de visitas um quarto de hora. Em cima da mesa redonda está um livro de capa verde. Abro-o. “Bruckner, O Medico Homeopata”. Instintivamente procuro a seção Nariz. Leio conjuntos de sintomas. Um deles coincide com os sintomas da rinite de Edgar. Prescrição:”Mercurius”. Entra a prima. Conto o caso do menino e aquele encontro ali. “Vale alguma coisa isto de homeopatia?” pergunto céptico. E ela: “Experimente. Não Custa”.

Quando saí, passei pela farmácia. “Tem Mercurius?” Tinha. Comprei Cinco Tostões. “Almeida Cardoso- Rio”. Levo pra casa. Falo a Purezinha. Sem fé nenhuma, dou automaticamente os carocinhos ao Edgar, mais do que mandavam as instruções. Cinco em vez de três. Depois, mais cinco. De noite, mais cinco. No dia seguinte, o milagre: todos os sintomas da rinite haviam desaparecido!… Mas sobrevirá uma novidade: purgação nos ouvidos. Cheio de confiança, corro à casa da prima, atrás do livro de capa verde. Procuro “Ouvidos” e leio esta maravilha: “As vezes sobrevém purgação no ouvido por abuso de Mercurius, e nesse caso o remédio é Sulfur”.

Vou voando a farmácia. Compro Sulphur. Mais 500 reis. Dou Sulfur ao Edgar e pronto – sarou do ouvido! Sarou da Rinite, sarou de tudo! Preço da cura: 1000 reis. Pela alopatia, em troca da não cura: varias consultas medicas, viagem a S. Paulo, drogas insuflantes e aparelho insuflador- e a desesperança.

Que fazer depois disso, Rangel, senão mandar vir um livro de capa verde e uma botica com todas as homeopatias do Almeida Cardoso? Cem mil reis custou-me, e desde então curo tudo. Curo tudo em casa e no pessoal da fazenda. Fiquei com fama de mágico. Vem gente dos sítios vizinhos. “Ouvi dizer que o senhoré um bom doutor que cura” – e curo mesmo. Chega a vir gente até do município vizinho atrás dos “carocinhos mágicos”…

Lobato

Texto integral retirado de: A BARCA DE GLEYRE; LOBATO, MONTEIRO , II TOMO QUARENTA ANOS DE CORRESPONDENCIA ENTRE MONTEIRO LOBATO E GODOFREDO RANGEL ; ED BRASILIENSE LIMITADA ,1946,1 EDIÇÃO.

Rui Barbosa
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Bento Mure
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Monteiro Lobato
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